ABEL ACÁCIO DE ALMEIDA BOTELHO (1854-1917)
Abel Botelho (Tabuaço, 1854 – Buenos Aires, 1917)
No dia 23 de setembro último, completaram-se 158 anos sobre o nascimento de Abel Acácio de Almeida Botelho. Trata-se de um nome brilhante da literatura portuguesa, que, apesar de ter andado esquecido no nosso país desde praticamente a sua morte (24 de abril de 1917), tem sido ultimamente lembrado, quer pela sua terra natal (Tabuaço), quer por outras terras da Beira (designadamente Cinfães), que não esquecem as ricas referências que lhes fez na sua obra.
Vem a recordação deste nome a propósito de um Colóquio, intitulado precisamente “Abel Botelho connosco”, que teve lugar no passado dia 22 de setembro, em Tendais, uma das freguesias do município de Cinfães, que o escritor brindou com o conto “A Fritada”, que tem como cenário a linda aldeia de Aveloso, na encosta descendente de Montemuro para o Douro, a chegar ao vale do Bestança. Este conto foi agora republicado por Antonino Jorge, que foi um dos conferencistas deste encontro. Os outros foram César Luís Carvalho, que falou da “ruralidade” em Abel Botelho; Valle Figueiredo, que apresentou as relações próximas de Camilo com Abel Botelho; e Maia Marques que tratou das afinidades de Abel Botelho com a Beira. O Colóquio, que teve a pronta adesão dos autarcas locais e de Tabuaço, valeu pelas excelentes comunicações, mas também pela visita à aldeia de Aveloso, que conserva ainda muito da paisagem e do “modus vivendi” comunitário que Abel Botelho tão bem soube descrever. As gentes, surpreendentemente hospitaleiras como as de outrora, juntaram-se aos visitantes e houve festa espontânea nas eiras comunitárias da aldeia, qual rossio de romaria, ali mesmo aos pés da capelinha de Santa Ana e de S. Joaquim, a fazer lembrar a genealogia do cristianismo e do mundo. Música, pão, broa, vinho, bolo de manteiga e de carne, dança e conversa, tudo se harmonizou, com o som intercalado dos sininhos das vacas, que, indiferentes seguiam, cada qual o seu caminho, enquanto os visitantes, se deslumbravam com as paisagens a descerem até ao Douro, que não se via, mas se adivinhava, lá no fundo, antes de os olhos começarem a subir do outro lado até ao cimo do Marão, que lá no alto, se confundia com as nuvens a prometerem chuva, que os tendalenses pediam para dar maior volume às castanhas e que, no dia seguinte, havia de cair.
Mas voltando a Abel Botelho, devo dizer que ele foi, 1.º que tudo, um militar, ocupando diversos postos na sua carreira, até chegar ao de Coronel. Com a República, ele que era claramente afeto ao novo regime (vários são os textos em que critica a decadente monarquia; aliás, ele foi maçon, tendo feito a sua iniciação em 1910, na Loja `Irradiação´, de Lisboa, tendo utilizado o simbólico nome de “Spinosa”) assumiu uma maior participação política, tendo integrado mesmo a Comissão que apresentou ao Governo Republicano o projeto da atual Bandeira Nacional. Como político republicano ativo foi eleito Deputado Constituinte por Chaves, em 1911, e seria, mais tarde, eleito Senador.
Importante foi também a sua faceta de diplomata. E foi no desempenho do cargo de Ministro de Portugal na Argentina, que faleceu, em Buenos Aires, a 24 de abril de 1917.
No que respeita à escrita, foi multifacetado: escreveu ampla obra, em prosa (contos, teatro, crítica social, publicando alguns livros que integrou na série a que chamou “Patologia Social”, e que causaram escândalo na época, tendo alguns sido proibidos), mas também em verso. Tinha igualmente jeito para o desenho e foi mesmo dos primeiros portugueses a fazer crítica à produção artística nacional. Toda a sua obra (escrita e desenho) se integra nitidamente no naturalismo. Colaborou regularmente em diversas publicações periódicas, designadamente, em O Dia, Ocidente, O Século, A Ilustração, Revista Moderna, Revista Literária, Serões, Mala da Europa, Diário da Manhã, Novidades, Correio Português, Portugal, Reporter, de que foi director, e A Capital.
Precisamente este último jornal, “A Capital”, na sua edição de 25 de abril de 1917, ao noticiar a sua morte, escreve, a dada altura, o seguinte: «Abel Botelho foi acima de tudo um homem de letras de indiscutivel merecimento, um romancista cuja obra occupa um logar á parte na litteratura portugueza contemporanea.
Os romances que subordinou a uma serie intitulada “Pathologia social” obtiveram ainda maior exito pela crueza do assumpto de alguns d’elles, pelo escandalo que produziram…»
Mais adiante, refere-se que as suas obras «encerram muitas das mais bellas paginas que teem sahido d’uma penna portugueza. Abel Botelho era um estylista muito pessoal, podendo dizer-se que a sua prosa se não confundia com nenhuma outra. Analysava as almas e as coisas com minucias de anatomista e dispunha d’um abundante e pittoresco vocabulario onde não faltavam os neologismos.
Poeta e dramaturgo, os seus primeiros trabalhos litterarios de certo vulto foram algumas peças que chamaram as attenções do público e da critica (…)».