A REVOLUÇÃO DOS CRAVOS OCORREU HÁ 40 ANOS
No último fim de semana, um pouco por todo o país, comemorou-se o triunfo do Movimento das Forças Armadas, ocorrido há 4 dezenas de anos, mais precisamente no dia 25 de Abril de 1974.
Por ser verdadeiramente inesperado, e quase incrível (tantas tinham sido as intentonas revolucionárias derrotadas, tantos os milhares de cidadãos presos, torturados, e alguns mortos), ainda se tornou mais apreciado este movimento revolucionário que trouxe liberdade ao povo português e, com ela, os meios indispensáveis à qualidade de vida, que, pese embora a situação vivida nos últimos anos, é incomparavelmente melhor há que existia até àquela data. Só quem não viveu naquele tempo é que não consegue sentir as grandes diferenças de um regime autoritário e cruel para uma política que respeita os direitos fundamentais dos cidadãos.
Na verdade, depois da agitação inicial do período revolucionário que se prolongou até pelo menos ao dia 25 de novembro de 1975, ganhou raízes, e ainda bem, a democracia política, a nível do poder central e do poder local, acabando de vez com todos os organismos da ditadura. A Constituição de 1976, ainda em vigor mas com grandes alterações, sobretudo no ano de 1982, foi a grande obra legislativa que marca o início de uma democracia consolidada, que alguns denominam de III República.
Acabou a Guerra, extinguiu-se a Pide, reconheceu-se o direito de opinião e de reunião, terminou a Legião e a Mocidade portuguesas, constituíram-se, livremente, partidos políticos e sindicatos, libertaram-se todos os presos políticos e prometeu-se tudo fazer para melhorar a vida do nosso povo, tão sofrido e vilipendiado.
Tudo mudou. Até a forma de ensinar História se alterou: deixou de ser tão positivista, baseada na memória de dinastias e reis, para ser mais muito mais explicativa e estruturalista, na linha, aliás, das novas orientações da epistemologia da História por esse mundo fora.
Há 40 anos estava em Coimbra, mas lembro-me muito bem da emoção coletiva que invadiu as ruas, nesse dia primaveril, em que, finalmente, se respirava um ar de liberdade que ninguém conhecia.
Esta revolução protagonizada por aqueles que mais diretamente sofriam os efeitos da guerra, desencadeou necessariamente outras mudanças precisamente nesses territórios que até então eram dirigidos por Lisboa. A Guiné-Bissau (10 de setembro de 1974), Moçambique (25 de junho de 1975), Cabo Verde (5 de julho de 1975), S. Tomé e Príncipe (12 de julho de 1975), Angola (11 de novembro de 1975) e Timor-Leste (1.º, em 28 de novembro de 1975, e, finalmente, em 20 de maio de 2002) puderam aspirar a um futuro de paz e a uma vida independente dos desígnios colonialistas do distante país europeu. Mais tarde, Macau, num contexto completamente diferentes, foi integrado na República Popular da China, embora viva numa situação de regime especial até ao fim de 2049. Até os Arquipélagos da Madeira e dos Açores, mantidos por razões óbvias no território português (é preciso lembrar, que os portugueses encontraram as ilhas desabitadas e foram os nossos antepassados os seus principais colonizadores) ganharam uma autonomia regional, que no tempo do “Estado Novo” seria impensável.
É claro que não correu tudo bem; as convulsões do PREC assustaram quem as viveu, fazendo prever o desencadear, a qualquer momento, de uma guerra civil o que felizmente não sucedeu. E para a evitar, entre os partidários de um regime muito próximo das típicas “democracias populares” da Europa de Leste e aqueles que defendiam o modelo democrático ocidental, O 25 de novembro de 1975, com a direta participação do General Ramalho Eanes, também ele um dos nomes ligados ao Movimento das Forças Armadas, foi determinante para construção de uma democracia pluralista à moda ocidental como hoje, efetivamente, temos.
Houve indiscutíveis ganhos na educação, na emancipação da mulher, na saúde, nas vias e meios de comunicação e na justiça. Virámo-nos definitivamente para a Europa (adesão à CEE, em 1986) e para o Mundo (acabou-se o isolamento internacional; Portugal chegou a presidir à Assembleia Geral e até ao seu poderosíssimo Conselho de Segurança) e criaram-se novas formas de solidariedade institucional com o mundo português, com a fundação dos PALOP e da CPLP.
Contudo, os últimos anos têm sido de grandes dificuldades para a generalidade dos portugueses, mormente para os que perderam o emprego e conhecem grandes dificuldades em sobreviver com dignidade. E enquanto isso acontecer, temos de nos insurgir contra quem nos governa e exigir que os ideais de Abril se cumpram em pleno, isto é, que todos os portugueses possam viver sem terem de recorrer à mendicidade.