Recordando a última Peregrinação deste ano
No dia 13 de outubro de 2014, apesar do mau tempo, milhares de fiéis voltaram a juntar-se num dos mais importantes santuários marianos do Mundo, que, anualmente, é o destino de milhões de peregrinos, crentes, ou simples curiosos que pretendem ver com os seus próprios olhos o local onde Nossa Senhora terá aparecido seis meses seguidos (de maio a outubro de 1917) aos pastorinhos (Lúcia, Jacinta e Francisco). Esses factos ocorreram na Cova da Iria, o nome dos campos onde as três crianças habitualmente guardavam as ovelhas. Não havia casas, e aqueles terrenos pertenciam (e pertencem ainda) à freguesia de Fátima, no concelho de Ourém, distrito de Santarém. Atualmente, pertence à diocese de Leiria-Fátima, assim designada desde 13 de maio de 1984. No tempo das aparições a diocese de Leiria estava extinta, desde 1882, tendo sido restaurada em janeiro de 1918, no ano a seguir às aparições marianas.
Foto dos Pastorinhos de Fátima (in "Ilustração Portuguesa", edição de 29 de outubro de 1917)
O contexto em que se deram as aparições é particularmente complexo, pois Portugal estava diretamente envolvido na Primeira Guerra Mundial (na Frente Ocidental e em Angola e Moçambique) e, sendo ainda tempo de republicanização, o ambiente político era completamente adverso a este tipo de manifestações religiosas. Daí, o comportamento pidesco do Administrador de Ourém no interrogatório aos pastorinhos, bem patente nas Memórias da Irmã Lúcia (uma das pastorinhas da Cova da Iria e única sobrevivente) e nos registos da imprensa do tempo.
A verdade é que o fenómeno de Fátima se consolidou, no período do Estado Novo, e a Igreja Católica acabou por reconhecer credibilidade a estas aparições. Fátima e Leiria (cidade mais próxima) são conhecidas em todo o Mundo, devido a Nossa Senhora de Fátima.
Fátima tornou-se o Altar do Mundo, que justificou a vinda já de 3 papas: Paulo VI, em 13 de maio de 1967, por ocasião do Cinquentenário daquelas aparições (foi mesmo o primeiro papa a visitar Portugal); João Paulo II, o papa devoto de Fátima que aqui veio três vezes (maio de 1982, maio de 1991 e maio de 2000) e Bento XVI, em maio de 2010, tendo-se então comemorado o 10º aniversário da beatificação dos irmãos Jacinta e Francisco Marto, cujos túmulos se encontram na basílica neoclássica que se ergue na parte mais alta do recinto do Santuário de Fátima. Espera-se que, pela ocasião do Centenário, daqui a menos de 3 anos, venha o Papa Francisco.
Interessante é também a Capela das Aparições que marca o local onde terão ocorrido as aparições de Nossa Senhora. Interesse turístico tem, igualmente, o pedaço do Muro de Berlim no espaço ajardinado da parte sudeste do Santuário (símbolo do fim do Comunismo, revelado como um dos segredos de Fátima, mas que é, sobretudo, símbolo da Paz, porque marca o fim da Guerra Fria).
Para presidir à peregrinação internacional de outubro de 2014 (que contou com muitos milhares de fiéis, 10 bispos e 310 sacerdotes), foi convidado o Arcebispo de Goa e Damão (na antiga Índia Portuguesa), Filipe Néri Ferrão que na sua homilia destacou a importância da família que, com a sua transmissão de valores, está, ou deve estar, na base da sociedade. Não deixa de ser curioso este convite ao Arcebispo de Goa, quando também no dia 15 de outubro de 2014, fez 40 anos que Portugal reconheceu a soberania da Índia em Goa, Damão, Diu, Dadrá e Nagar-Aveli depois da ocupação, pela força, em 1961 e em 1954 (no caso destas duas últimas localidades).
Termino com a transcrição de uma pequena passagem tirada da “Ilustração Portuguesa”, de 29 de outubro de 1917, em que Avelino de Almeida, jornalista enviado a Fátima pelo “Século”, se refere assim ao que vivenciaram mais de 50 mil pessoas que nesse dia acompanharam os pastorinhos nas anunciadas, como as últimas, Aparições Marianas:
«(…) E, quando já não imaginava que via alguma coisa mais impressionante do que essa rumorosa mas pacifica multidão animada pela mesma obsessiva idéa e movida pelo mesmo poderoso anceio, que vi eu ainda de verdadeiramente estranho na charneca de Fátima? A chuva, á hora prenunciada, deixar de cair; a densa massa de nuvens romper-se e o astro-rei-disco de prata fosca – em pleno zenith aparecer e começar dançando n’um bailado violento e convulso, que grande numero de pessoas imaginava ser uma dança serpentina, tão belas e rutilantes côres revestiu sucessivamente a superfície solar…
Milagre, como gritava o povo; fenomeno natural, como dizem sábios? Não curo agora de sabel-o, mas apenas de te afirmar o que vi… O resto é com a Ciencia e com a Egreja…».