Fortuna de Afonso Costa, os Mutilados da Guerra e o custo desta
Primeira Página de "A Capital" de 23 de janeiro de 1918
No período em que Sidónio Pais assumiu o poder em Portugal, os seus adversários políticos, como Afonso Costa e Bernardino Machado, foram exilados e a sua vida devassada. No caso de Afonso Costa a devassa recolheu dados comprometedores.
O diário republicano da noite, “A Capital” de 23 de janeiro de 1918, num artigo de “devassa”, é mesmo esse o título de 1.ª página, onde refere, em subtítulo “A fortuna do sr. Afonso Costa”, ao tempo em “maus lençóis”, por causa da governação de Sidónio Pais.
Os dados desse artigo são transcritos do “Diário de Notícias”, da mesma data, e aí se declara a existência de «um cofre que o sr. Affonso Costa tinha alugado no Banco Lisboa & Açores, para arrecadação dos seus valores, joias, papeis de credito, etc. E o mesmo jornal acrescenta que no dito cofre, reservado ao chefe do partido democrático desde 18 de maio de 1914, foram encontradas acções do Banco Nacional Ultramarino, do Banco de Portugal e da Companhia de Caminhos de Ferro da Beira Alta, bilhetes do tesouro e um collar de brilhantes (…). Os valores encontrados, refere ainda o Diario de Noticias, na importância de 80 contos, ficaram em poder da policia de investigação (…)». E a “devassa” avança com outros dados e outras suspeitas.
No mesmo jornal, bem mais preocupante é a questão de “Os nossos mutilados da Guerra”, um outro título, apelando à urgência da organização dos serviços de apoio a estas vítimas do Grande Conflito que assolava a Europa e o Mundo, desde 1914. Muitos dos feridos vinham mutilados, o que lhes retirava não só a capacidade militar mas também, na maior parte dos casos, a capacidade de angariar o seu sustento e o das suas famílias. O jornal acusa as autoridades portuguesas de esquecerem estes soldados que se sacrificaram pela Pátria, não lhes pagando o pré, as pensões e as reformas, por não haver nada legislado sobre o assunto. Afirma mesmo que há casos de soldados que não recebem o pré há 6 meses e mais, que há evacuados de África que há mais de um ano que não recebem qualquer importância e evacuados de França, a quem se devem meses de trabalho em campanha e, também, meses de hospitalização. Enquanto não se legisla sobre este caso, o articulista (José Pontes – desportista, jornalista, médico e político) defende que os estropiados, enquanto se encontram nas escolas de reeducação, deveriam receber como se estivessem em campanha e as famílias a pensão.
Já sobre o custo material desta Guerra para Portugal, num escrito de Brito Camacho (médico militar, escritor, publicista e político republicano), publicado em 24 de janeiro de 1918, há cem anos, e sob o título “Responsabilidades” interroga-se sobre quanto poderá custar esta Guerra (na África e na Europa) a Portugal. Refere que se tem dito que a Inglaterra fez um crédito de 20 milhões de libras. Afirma que ao começar a Guerra tínhamos uma dívida de 300 a 400 mil contos, cujos encargos representavam cerca de 21 mil contos anuais, num orçamento de cerca de 71 mil contos. E conclui: «Se a guerra nos trouxer uma nova dívida, igual à que já tínhamos, entraremos na paz com uma dívida efectiva de 700 a 800 mil contos, e admitindo que conseguimos pagar, em juros e amortização, seis por cento, teremos um encargo anual, despesa improdutiva, de 42 a 48 mil contos. / Onde iremos buscar os recursos para o custeio desta dívida enorme?».