UMA RAINHA PORTUGUESA QUE MARCOU A CORTE INGLESA
Completaram-se recentemente 329 anos sobre o fim do reinado de D. Catarina de Bragança, como rainha consorte de Inglaterra, que durou cerca de 23 anos (1662-1685). Nasceu em 25 de novembro de 1638, em Vila Viçosa, onde então viviam seus pais os Duques de Bragança, D. João e D. Luísa de Gusmão.
Após a Restauração da Independência, a negociação do seu casamento entrelaçou-se com os interesses diplomáticos de Portugal, na conjuntura da Guerra com a Espanha. Acabaria por casar-se, em maio de 1662, com o penúltimo rei absoluto de Inglaterra, D. Carlos II. Como dote de casamento, o Rei português pagou 2 milhões de cruzados e entregou à Inglaterra, a cidade de Tânger, no Norte de África, e Bombaim (hoje a maior cidade da Índia), na costa Oriental Indiana.
No despique pelo poder, D. Carlos II foi derrotado por Cromwell, exilando-se durante 9 anos na Europa Continental (França e Holanda). Voltou a Inglaterra para governar a partir de 1660. Dois anos depois casou com D. Catarina de Bragança e, desde logo, a rainha mostrou a força do seu carácter obrigando o Rei a duas cerimónias de casamento (uma pela Igreja Católica, em segredo; outra pela Igreja Anglicana, em público).
A vida de casada com o monarca inglês não foi fácil, porque o rei teve várias amantes, algumas na própria Corte. Teve dessas relações vários filhos ilegítimos mas nunca conseguiu ter qualquer filho legítimo, apesar de D. Catarina ter engravidado mais do que uma vez.
Pese embora tenha havido muitos períodos de tensão entre o casal real inglês, a verdade é que D. Catarina, apesar de detestada na Corte e na elite social inglesa, teve grande influência junto do marido e da própria vida na Corte, que depois dela e por causa dela nunca mais foi como dantes.
Foi certamente por sua influência que D. Carlos II, em 1672, assinou a Declaração de Indulgência, na qual manifestava a intenção de suspender todas as leis que penalizavam os católicos.
Efetivamente, D. Catarina, teve um papel importantíssimo nas alterações que se fizeram na vida social inglesa pelo que, ainda hoje, é amplamente reconhecida, admirada e homenageada.
Pode mesmo afirmar-se que provocou uma autêntica revolução na Corte Inglesa, apesar de ter sido muitas vezes hostilizada, mas sem nunca desistir da sua maneira de ser, acabaria por conseguir que até aquelas que antes a criticavam, passassem, com o decorrer do tempo, a imitá-la.
Entre as alterações no modus vivendi da Corte Inglesa que se lhe ficaram a dever, constam as seguintes: o consumo de laranjas (Catarina adorava laranjas e nunca deixou de as comer, pois sua mãe enviava-lhe, regularmente, cestos delas. Delas se fazia também a compota de laranja que os ingleses chamam, erradamente, de “marmelade”, o termo português marmelada, que já tinha sido introduzida na Inglaterra em 1495 pelos portugueses. D. Catarina guardava a compota de laranjas normais para si e para as suas amigas e a de laranjas amargas para as inimigas, principalmente, para as amantes do rei); o hábito do “chá das 5!” (costume que levou da Corte de Lisboa e que continuou a praticar em Londres, servindo para juntar amigas e inimigas. Este hábito generalizou-se de tal maneira que, ainda hoje, há quem pense que o costume de tomar chá a meio da tarde é de origem britânica, quando afinal lá foi introduzido por uma portuguesa); no modo de vestir introduziu a saia curta (naquele tempo, saia curta era acima do tornozelo e Catarina escandalizou a corte inglesa por mostrar os pés, o que era considerado de mau-gosto e que não admira devido aos pés enormes das inglesas) e o hábito de vestir roupa masculina para montar; para comer introduziu o uso do garfo (na Inglaterra, mesmo na Corte, comiam com as mãos, embora o garfo já fosse conhecido, mas só para trinchar ou servir. D. Catarina estava habituada a usá-lo para comer e, em breve, todos faziam o mesmo) e a porcelana (estranhou comerem em pratos de ouro ou de prata e não em pratos de porcelana como se fazia, já há muitos anos, em Portugal. A partir de aí, o uso de louça de porcelana generalizou-se). No que respeita à música, D. Catarina levou no seu séquito uma orquestra de músicos portugueses e foi por sua iniciativa que se ouviu a primeira ópera em Inglaterra. D. Catarina levou consigo, também, alguns móveis, entre os quais preciosos contadores indo-portugueses que nunca tinham sido vistos em Inglaterra.
Depois da morte de seu marido, em 6 de fevereiro de 1685 (que pouco antes se convertera ao catolicismo por influência da esposa), ainda permaneceu na Inglaterra durante o reinado do cunhado, Jaime II, regressando a Portugal só em 1692.
Chegou a ser Regente do Reino de Portugal, por duas vezes, quando seu irmão D. Pedro II se teve de ausentar por motivos de ordem política. Faleceu no último dia do ano de 1705, em Lisboa, com 67 anos.