Mal se declara a 1.ª Guerra Mundial, Portugal diz-se preparado para entrar!
Há cem anos, quando os vários países da Europa se envolviam diretamente nesta guerra que havia de ter proporções nunca vistas, pela manutenção dos seus impérios, Portugal afirmou publicamente, nos seus órgãos de poder (Parlamento e Governo) e na imprensa que estava interessado em cumprir os seus compromissos com os Aliados (referindo-se explicitamente à Inglaterra) e, portanto, não afirmaria nunca a sua neutralidade.
Entretanto, o conflito ia alastrando. No dia 4 de agosto de 1914, a Inglaterra declara guerra à Alemanha, esta declaração de guerra é considerada por muitos como a decisão que torna esta guerra europeia verdadeiramente a Primeira Guerra Mundial. Dois dias depois, o Império Austro-Húngaro declara guerra à Rússia. A Sérvia e o Montenegro declaram guerra à Alemanha. A 13 de agosto, a França e a Inglaterra estão também em guerra com o Império Austro-Húngaro.
Portugal, compreendendo os motivos profundos deste embate, e ainda com um império para defender, em África e na Ásia, não pode ficar indiferente ao que acontece na Europa e no Mundo. É preciso recordar os nossos leitores de que os republicanos portugueses mostraram-se, desde sempre, profundamente nacionalistas e patrióticos. Foi aliás esta característica que os guindou para o poder, após o triunfo da revolução de 4 e 5 de outubro de 1910. Eles cresceram afirmando os valores nacionais e lutando contra a humilhação em que os nossos “inimigos” nos puseram na sequência do “Mapa cor-de-rosa”.
Não é pois, de estranhar, que partidos políticos, governo, militares e povo, estejam unidos nesta hora de mobilizar Portugal para a guerra.
O jornal A Capital deste dia (13-8-1914), noticiando a evolução da guerra, logo na primeira página, relativamente, a Portugal afirma:
«A situação de Portugal no conflicto europeu está definida. Defeniu-a o governo no Parlamento portuguez, com o caloroso aplauso dos representantes da Nação. Não ha, nem deve, nem pode haver outra definição. Estamos ao lado da Inglaterra. Não faltaremos a nenhum dos deveres que a nossa situação de aliados d’esse grande e nobre paiz nos impõe. Esta situação é tão clara, tão terminante, tão categorica, tão franca, tão leal, que só d eouvir pronunciar indevidamente a palavra neutralidade a opinião publica se sobresalta e se indigna. O admiravel instincto popular, que é tantas vezes o melhor dos politicos, e que sempre representa as mais nobres aspirações, não a consente, não admite, não a emprega.
Tambem o governo a não emprega nos seus actos officiaes. Nem a poderia empregar, porque não faria sentido, nem com com as declarações do seu chefe, no Parlamento, que a todo o governo obrigam, nem com a expressão da vontade d’este Parlamento, que está acima do próprio governo, porque representa a vontade soberana do Paiz. Não! Portugal não está n’uma situação de neutralidade. Está n’uma situação de franco e declarado apoio á Inglaterra.»
Mais à frente, ainda na 1.ª página, escreve-se, no mesmo diário, sob o título “Se fosse necessario Portugal mobilisaria 40:000 homens prontos a entrar em campanha”:
«É bem possível que á força de se dizer que a nossa preparação militar pouco ou nada vale, haja quem julgue que Portugal se encontra na impossibilidade de mobilisar forças numerosas, de maneira a poderem entrar imediatamente em campanha. É um equivoco, como tantos outros em que por ahi se vive e que não será de todo mau desfazer. Tem, para isso, a palavra o deputado sr. Sá Cardoso, que pela sua situação especial e pelo profundo conhecimento que possue das coisas militares, está em condições de poder repor as coisas no seu verdadeiro pé, sem exageros optimistas, improprios da sua honestidade, nem pessimismos que não se compadeceriam com as afirmações de patriotismo que elle, por tantas vezes, e em occasiões dificeis, tem feito. Ouçamol-o: (…)
É que quando por ahi se afirmava que não tinhamos armas, nem equipamentos, nem artilharia, o que se queria era acentuar que não havia possibilidade de pôr em pé de guerra os 180.000 ou 200.000 homens que constituem, n’este momento, o nosso exercito activo. Mais nada. Mas para duas divisões, pelo menos, ha e sobra. Podemos, sem contestação, mobilisar em poucos dias um corpo de exercito de 35.000 a 40.000 homens, com 25.000 de infantaria e 12 baterias de artilharia com 72 peças Schneider-Canet, eguaes ás que o exercito francez usa e estão por lá obrando prodígios.»