Ainda a Guerra Peninsular
Há 203 anos, mais concretamente no dia 22 de julho de 1812, Arthur Wellesley, duque de Wellington, à frente de forças anglo-britânicas, na Guerra Peninsular, mas já fora do território português, derrota, mais uma vez, o exército de Napoleão Bonaparte, desta vez em Salamanca.
Nunca é demais recordar que, entre 1807 e 1811, Portugal foi vítima de 3 invasões napoleónicas. Acho preferível a designação “napoleónicas” em vez de “francesas” porque, como sabemos, entre os soldados enviados por Napoleão para a Península Ibérica, havia muitos que não eram franceses, mas que iam sendo recrutados pelos franceses nas terras europeias ocupadas por França. Também em Portugal foram recrutados muitos, basta lembrar que na Campanha da Rússia (em 1812), entre as tropas napoleónicas, contavam-se nove batalhões portugueses.
Não deixa de ser curiosa, a este respeito, a descrição que a Gazeta de Lisboa, n.º 312, de 29 de dezembro de 1810, faz do “inimigo” que no início do século XIX invadiu Portugal: «A invasão destes Vandalos, denominados Francezes, e que saõ huma mistura da gente mais corrompida e imoral, que tinha a França, e de Soldados violentamente arrancados de todos os Paizes da Europa, tem huma inteira similhança com outra feita no seculo 8.º pelos Mouros, que era igualmente composta dos diversos Povos da Asia, e da Costa Septentrional de Africa (…)».
As três invasões que Napoleão enviou a Portugal tinham como objetivo prioritário obrigar o nosso país a cumprir o “Bloqueio Continental” à Inglaterra. A 1.ª (1807) dirigiu-se a Lisboa, comandada por Junot que governou o país vários meses; a 2.ª (1809) dirigiu-se ao Porto; e a 3.ª (1810-1811) novamente a Lisboa, mas sem êxito. A vinda dos franceses provocou a vinda dos ingleses para ajudarem a defesa portuguesa, mas estes tornaram-se os dominadores de Portugal e dos seus interesses, o que provocou um ódio popular contra o domínio inglês, que muito contribuiu para a Revolução Liberal de 1820.
As consequências da Guerra Peninsular foram bastante nefastas para Portugal inteiro. Enquanto os franceses e os ingleses continuaram o seu desenvolvimento económico, os portugueses viram o seu território transformado em contínuo campo de batalha, as terras (cidades, vilas e aldeias) constantemente pilhadas, as sementeiras destruídas pelos exércitos e o desenvolvimento industrial incessantemente adiado.
Estas invasões foram a mais terrível e sangrenta guerra travada em toda a História no território português. São feitas habitualmente críticas contundentes à forma como se combateu o invasor, sobretudo pela “fuga” precipitada da família real e da Corte para o Brasil. Talvez fosse possível ter reagido de uma forma organizada em colaboração com os ingleses, já que Junot chegou a Lisboa com poucos homens.
Os registos que ficaram retratam um país completamente devastado em que se contam factos onde o horror de tanto sofrimento imposto aos portugueses é uma constante. Nada até agora ultrapassou a crueldade e barbárie destes invasores. Aldeias, vilas e cidades, algumas bastante prósperas foram vandalizadas, pilhadas, incendiadas e destruídas. Mas estas atitudes irracionalistas de roubos, violência e indisciplina grassavam também no exército anglo-luso, obrigando por vezes Wellington a drásticas medidas disciplinares. Um período da nossa história que não se consegue esquecer.
Morreram mais portugueses nessa altura (cerca de 4 anos) do que somando todas as vítimas portuguesas da 1.ª Grande Guerra (1914-1918), da Pneumónica (1918) e ainda da Guerra Colonial (1961-1974).
A Batalha de Salamanca, como o envolvimento da Inglaterra na Guerra Colonial tem de entender-se à luz da defesa da própria Inglaterra que queria manter as tropas napoleónicas bem afastadas do seu território. Nesta batalha, o futuro Duque de Wellington (que mais tarde chefiaria o Governo Inglês por duas vezes) contou com cerca de 52 mil militares (30500 ingleses, mais de 18000 portugueses e quase 3400 espanhóis) contra cerca de 50 mil franceses.