Esgotada a “primavera marcelista” surge nova vaga de prisões
D. António Ferreira Gomes, um dos presos políticos que pôde voltar a Portugal no período do "Marcelismo"
Há 46 anos depois de esgotada a esperança das mudanças anunciadas pelo novo Presidente do Conselho, Marcelo Caetano, assiste-se, em 17 de fevereiro de 1970, a uma nova vaga de prisões da responsabilidade da PIDE tendo sido presos alguns homens que lutavam pela liberdade, nomeadamente Raul Rego, Salgado Zenha e Jaime Gama.
A “Primavera Marcelista” que o novo chefe do governo fez crer ao povo como uma fundada esperança de mudanças estruturais na sociedade e política portuguesas, não passou afinal de uma “renovação na continuidade”.
É verdade que permitiu o regresso de algumas figuras da oposição, como Mário Soares e o Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes. Também deu luz verde à realização do Congresso da Oposição (em Aveiro) e seriam mesmo implementadas algumas medidas liberais. Fez-se a reforma da educação (com Veiga Simão, que aumentou o n.º de escolas); os trabalhadores rurais foram integrados na Caixa de Previdência; a Oposição Democrática pôde participar nas eleições legislativas de 1969; algumas personalidades mais liberais puderam integrar as listas do partido da “União Nacional”, como Pinto Balsemão e Sá Carneiro, a PIDE passou a designar-se DGS, a “União Nacional”, ANP (Ação Nacional Popular) e a “censura”, em nome de uma maior abertura passou a denominar-se “exame prévio”.
A “Primavera Marcelista” rapidamente esmoreceu e acabou rejeitada. Formaram-se partidos de esquerda; jornalistas progressistas fundaram o “Expresso” (que denunciava as arbitrariedades da ditadura); os estudantes universitários protestaram; a guerra colonial era contestada até pela Igreja e as dificuldades económicas, agravadas pelo aumento do preço do petróleo, deixaram antever um futuro revolucionário.
O impacto da guerra colonial revelar-se-ia fatal para o devir histórico da nação portuguesa. A guerra colonial para além de dar uma imagem negativa de Portugal, nas instâncias internacionais, significou um enorme esforço financeiro e humano. Cerca de 8 mil jovens morreram em combate e muitos mais ficaram feridos. A Igreja Católica dividiu-se: se, por um lado, a hierarquia se mostrava neutral, houve muitas figuras da Igreja que se manifestavam contra a continuação desta guerra, reconhecendo o direito à autodeterminação dos povos.
Verificada a impossibilidade das mudanças desejadas, demitem-se alguns deputados da “Ala Liberal” na Assembleia Nacional e a PIDE faz novas prisões políticas. É neste contexto que em meados de fevereiro de 1970, são detidas figuras ligadas à oposição. Raul Rego é uma delas. Nascido no concelho de Macedo de Cavaleiros, foi professor e um dos fundadores do Partido Socialista. Pertenceu à Ordem da Maçonaria Portuguesa, tendo chegado a Grão-Mestre, na era da clandestinidade. Famosa ficou a sua ligação à direção do jornal “República”, um dos órgãos de comunicação social que no ano de 1975 se bateu pela manutenção da liberdade política e de expressão.
Salgado Zenha foi outro opositor preso em fevereiro de 1970. Natural de Braga, frequentaria a Universidade de Coimbra, onde se formaria em Direito. Ligado ao Partido Comunista, em 1940, seria um dos fundadores do Movimento de Unidade Democrática, no pós Guerra (1945). Participou na candidatura do General Humberto Delgado à Presidência da República em 1958. Em 1973 é também fundador do Partido Socialista.
Também Jaime Gama, outra personalidade ligada ao Partido Socialista, é preso em 17 de fevereiro de 1970. Jaime Gama nasceu nos Açores, tendo feito o ensino liceal em Ponta Delgada. Cursou depois Filosofia na Universidade de Lisboa, tendo sido professor do ensino secundário e superior privado. Em 1973, já depois de ter sido preso várias vezes, foi também fundador do Partido Socialista. Oficial miliciano em 1974, participa nas operações revolucionárias do “25 de Abril”.