André Francisco Brun
Oficial do Exército, escritor, humorista e dramaturgo, André Francisco Brun integrou o Corpo Expedicionário Português e partiu para França em 18 de Abril de 1917
Se houve pessoas, militares incluídos, que eram contra a participação portuguesa no palco europeu da Grande Guerra, também houve aquelas que insistentemente pediam a sua mobilização. É o caso de André Brun, a que a imprensa do dia 15 de agosto de 1918 faz repetida referência, dado o seu regresso a Portugal para gozo de licença.
O Jornal “A Situação”, diário republicano da manhã, precisamente na edição dessa data, na primeira página, dá a notícia do regresso a Portugal do major André Brun, prestigiado professor e escritor que tinha ido para a Guerra, em França, no ano anterior (1917).
A nota informativa explica a razão do seu regresso: gozo de licença de campanha, pois há 466 dias que se encontrava na Flandres, integrado no Corpo Expedicionário Português, 404 dos quais nas primeiras linhas de combate, assumindo o comando de um batalhão, durante dez meses e meio e tão bem o fez que lhe valeu a promoção, por distinção, a major e o direito à Cruz de Guerra com que foi distinguido.
E se não tinha mais tempo de combate foi porque não o deixaram ir mais cedo, conforme explica o jornal “A Capital”: «André Brun não partia. Mas esse facto não era devido à sua vontade. Não partia porque não o mandavam partir. (…) Esfalfava-se a solicitar que o mandassem para França, que o mandassem o mais depressa possível, embora ainda não fosse a sua vez de marchar. Sete vezes renovou esta solicitação. Sete vezes! E da última foi o nosso diretor que se dirigiu ao sr. Norton de Matos, pedindo-lhe que não demorasse mais o deferimento aos pedidos de André Brun, cuja reputação era todos os dias anavalhada por creaturas que nunca foram nem irão para o campo de batalha.»
Nascido aos 9 de Maio de 1881, em Lisboa, onde também morreu aos 22 de Dezembro de 1926, Andre Brun foi um dos nossos escritores alegres mais populares. Autor de algumas dezenas de livros, foi no teatro, como ele próprio declara numa autobiografia (in Consultório Psicológico), que alcançou «os mais lisonjeiros êxitos e alguns indispensáveis proventos. Mas, de par com esses livros, muito da sua obra ficou para sempre nas páginas dos diversos jornais em que colaborou, ora assinando com o seu nome, ora usando pseudónimos como Felix Pevide, O Porteiro da Geral, Gil Vicente da Costa, Cyrano, etc. Ao André Brun humorista alguns porventura preferirão o que escreveu em “A Malta das Trincheiras”, de que ele próprio afirma: “De todos os meus livros prefiro sentimentalmente A Malta das Trincheiras pelo muito que de mim mesmo lhe anda ligado”.»
É desse livro que extraímos a seguinte passagem: «Longe de mim a ideia de amesquinhar o esforço dos primeiros combatentes em França; mas, durante muito tempo, a permanencia n’uma guerra de trincheiras, em sectores relativamente calmos de que certa nervosidade destrambilhada vinda do alto pretendia fazer sem metodo sectores de verdadeiro combate, não permitiu que se posessem á prova senão a capacidade de adaptação que distingue a nossa raça, sempre atravez dos seculos a abandonada de alguem, e aquelas qualidades passivas de resignação que a Historia reconhece ao soldado portuguez. Dos dias terríveis de Abril até aos do alvorecer de Agosto, em que me separei da frente portuguesa, só o esforço individual de certos manteve a continuidade do esforço anterior, reduzida ainda ao trabalho obscuro da malta das trincheiras. Acompanhei bem de perto essa arraia meúda para a não amar e não a estimar. Foi com ela que ganhei os meus primeiros galões bem ganhos. Sei o que ela vale o que ela fez e o que ela podia ter feito no instante próprio, se os chefes combatentes (…) tivessem melhor atentado na importancia das suas funções humanas e cuidado com maior carinho e mais inteligente disvêlo do moral de tropas, já de si ignorantes e propensas á estagnação de espirito e fatalismo atavico e, para mais, atiradas para longe da terra onde tinham as rasões logicas do seu ser».